quarta-feira, 18 de abril de 2007

Bom senso


Poucas coisas se encontram tão justa e democraticamente distribuídas como o bom senso. Toda a gente acha que possui a quantidade exacta de que precisa. Ninguém se queixa de não ter suficiente, nem ninguém se sente minimamente carenciado. Antes pelo contrário, muitas pessoas até se julgam beneficiadas pela natureza, considerando ter mais que a maior parte das outras que conhece.

Assim fosse com a saúde, com a beleza, com a justiça, com o acesso a oportunidades na vida, com a posse de bens materiais, com a felicidade, com o dinheiro, com o poder, e com muitas outras coisas que toda a gente procura, precisa ou quer mais. Assim fosse e teríamos um mundo perfeito.

Embora muitas das melhores profissões certamente não tivessem hoje tanta saída. Sobretudo das que tratam questões relacionadas com a génese da insegurança de certas pessoas, como astrólogos, consultores e outros líderes espirituais.

terça-feira, 10 de abril de 2007

Desígnios

Uma pessoa, uma empresa, um país, um povo, precisa de valores, objectivos e causas em que acredite. Precisa de crenças que antecipem a hipótese de um mundo melhor e a esperança de uma vida mais segura, mais tranquila e mais feliz. Precisa de acreditar em projectos que materializem a possibilidade de participar na aventura de construir algo de um imaginário colectivo melhor.

Uma pessoa, isoladamente não é pessoa. A pessoa só existe como processo de socialização no seio de uma comunidade humana. E a personalidade é um produto dessa convivência gregária da espécie. A pessoa, todas as pessoas, precisam de convergir num núcleo essencial de valores, de crenças, de sonhos e de objectivos comuns. Qualquer que seja a sua cultura ou estádio de desenvolvimento civilizacional. A própria natureza da vivência em comunidade assim o exige. Por isso, se em determinados períodos alguns desses pontos comuns de partilha entram em conflito, por falta de definição ou por descrença, a procura de novo ponto de equilíbrio como solução para ultrapassar a crise, torna-se inevitável. Essa é a própria dinâmica da história da humanidade, marcada por ciclos de renovação em que se sucedem contínuamente avanços, paragens e retrocessos.

Qualquer comunidade humana - empresa, grupo, ou nação -, precisa ser continuamente convocada para novos desafios. Precisa de se identificar com causas em que acredite que vale a pena lutar. Precisa de partilhar uma visão, precisa de alimentar a esperança de poder melhorar, precisa de acreditar que pode vencer. Para isso são precisas ideias força, capazes de funcionarem como estímulos catalizadores da energia colectiva num sentido positivo. Caso contrário, a comunidade por si própria desencadeará mecanismos de crise e de ruptura social, tendentes a recriar oportunidades de crença comum numa nova situação de equilíbrio.

Ora a ausência de causas mobilizadoras, está a arrastar o País para um clima intrigante de desmotivação e de descrença. Um clima propício ao empolamento de acontecimentos laterais que, embora criticáveis, mas sem dimensão e importância que objectivmente o justifique, ameaça prejudicar a necessária mobilização colectiva para os grandes desafios de tirar o país do marasmo e as empresas do caminho da degradação. Um clima que não cria riqueza, nem empregos; não contribui para o desenvolvimento, nem para o bem estar; não promove a auto-confiança, nem a auto-estima dos portugueses. Sem lógica, nem proveito para ninguém.

E sem desígnios mobilizadores não sairemos disto…

quarta-feira, 28 de março de 2007

Ganhar o jogo




Só há três maneiras de ganhar um jogo de futebol: com a equipa motivada para ganhar e tecnicamente bem preparada; com um árbitro de apito dourado; ou com a sorte da lotaria.

Qualquer treinador da terceira liga sabe isso. Talvez não saiba é que essas mesmas condições se aplicam nas empresas, ferroviárias e outras. Ou seja, o caminho para o sucesso tem apenas três vias. Só se chega lá:
» De forma consistente e duradoura, apostando na motivação e preparação técnica das pessoas;
» De forma virtual e transitória, manobrando na sombra dos bastidores, da política ou das influências pessoais;
» De forma maravilhosa e instantânea, com um milagre.

Mas se algum ferroviário no activo, mesmo que seja administrador ou paraquedista, souber de alguma outra forma para levar uma empresa a ganhar o jogo do progresso e da modernidade, olhe, mande um e-mail.

sexta-feira, 23 de março de 2007

Marcas digitais

Vistas a uma certa distância todas as pessoas parecem iguais. Mas quanto mais nos aproximamos mais nos apercebemos que existem diferenças. Para além de diferenças físicas, de idade, de género, de estatura ou de cor, que imediatamente se constatam, existem outras, que só um contacto mais directo nos permite perceber e identificar. Diferenças de crença, de valores, de vivência, ou de conhecimento. Mas também de outras, que resultam de um vasto conjunto de aptidões psicológicas essenciais, responsáveis pelas nossas atitudes e comportamentos em cada situação e circunstância que se nos depara ao longo da vida.

Ora é sobretudo o conjunto destas aptidões individuais, sejam elas inatas ou aprendidas, ou ambas, que fazem a diferença entre os grandes homens (no sentido de espécie humana) e os outros. Qualquer que seja o lugar, o tempo, a profissão, ou a actividade, por onde o homem passa, deixa inevitavelmente a marca da pessoa que é. As suas acções, tal como as suas impressões digitais, deixam o lastro de uma marca individual que ninguém pode ignorar nem evitar.

A honradez, a integridade, a lealdade, a perseverança, a coragem, a resistência às adversidades, a humildade, a dedicação aos outros, a generosidade, o altruísmo, e a convivência harmoniosa, são, entre outras, aptidões que encontramos naqueles que de entre nós foram, ou são, os grandes homens. Com essas aptidões realizam, ou deixaram, marcas que os enobreceram e que nos enobrecem a todos.

Quando o destino lhes reservou um papel de dirigentes, com maior relevo social, esses homens sabem estar à altura dessa responsabilidade. Sabem utilizar o poder que lhes foi conferido, unicamente para prossecução do bem comum. Têm clara consciência de qual é a sua missão e dos objectivos a atingir pela comunidade ou grupo que dirigem. Tudo fazem para deixar uma marca que signifique um avanço, no sentido de melhorar as coisas. Seja um país mais desenvolvido, uma instituição mais útil e eficaz, uma empresa mais sólida e eficiente, ou um mundo mais justo e melhor. Entendem que a sua missão está ao serviço de causas nobres, sabendo que é essa exclusivamente a legitimidade do poder, político, social ou patronal, que lhes foi conferido. Sabem exercer o poder para servir, não para se servirem dele.

Esses são os grandes homens que merecem o nosso respeito e admiração. É do exemplo de homens desses que precisamos.

quarta-feira, 21 de março de 2007

Pior a emenda que o soneto

Em 1971, quando o jornal New York Times publicou um conjunto de documentos do Pentágono que provavam o complexo envolvimento dos Estados Unidos na guerra do Vietname, Henry Kissinger ficou furioso pela forma negligente como o governo deixou escapar essa informação. Resolveu então tomar medidas drásticas que levaram à formação de um grupo de fiéis chamado “Os Bombeiros” para tapar o buraco que tinha permitido a fuga de informação.

Ao contrário do que Henry Kissinger desejava, o seu excesso de zelo perante este caso, viria porém a provocar muito maior interesse na opinião pública. Daí foi um passo para que o escândalo rapidamente ganhasse dimensão política. A situação tornou-se de tal modo incontrolável que foi a própria unidade de intervenção, criada exactamente para controlar a crise, que acabou por invadir o escritório do Partido Democrático no Watergate Hotel, desencadeando um conjunto de acontecimentos em cadeia que culminaram na queda do Presidente Nixon.

Ora a forma inconsequente como alguns responsáveis reagem quando se tornam públicas certas situações que eles próprios criaram, chegam a fazer lembrar este caso. O que implica um de dois entendimentos possíveis: ou na ferrovia se sofre de um grave sindroma de esquecimento, ou já não se atende aos ensinamentos da história.

Entre outros, o episódio das indemnizações/contratações Refer/Rave, a venda/liquidação CP/Tex, ou o eclipse estratégico EMEF, são todos casos completamente diferentes. Excepto num ponto: nenhum deles está ainda absolutamente clarificado. E não se pense que basta retirar algumas páginas do livro para apagar a memória.

terça-feira, 20 de março de 2007

Burocracia

Em 1949, a Câmara de Paris tendo necessidade de salas disponíveis para instalar novos serviços, descobriu uma sala onde funcionava o Departamento dos Prejuízos Causados pela Enchente de 1910. Na secção ainda “trabalhavam” dois funcionários idosos, que revelaram ter o Departamento pago a última indemnização devida em 1913, ou seja 36 anos antes.

Não sabemos se ainda se mantém este recorde, de serviços que permanecem anos e anos depois de já não terem qualquer utilidade que os justifique. Do que toda a gente sabe é do sucessivo aparecimento de novos departamentos que ninguém percebe para que é que servem, para além de atrapalharem, constituindo fonte de desmotivação para quem trabalha. O que significa, entre outras coisas, que a burocracia continua a ter por cá muitos defensores. Quer exemplos? É simples, procure-os na Refer, na CP e na EMEF.